23 de novembro de 2008

COWBOYS & SAMURAIS


O caráter de um homem é moldado pelos heróis de sua infância.

E o herói de que eu estou falando é aquele fantasioso, inatacável, que nunca falha e está sempre vestido a caráter. Aquele que todo menino nem tenta copiar, pois sabe que é impossível alcança-lo. É o personagem que ocupa o imaginário infanto-juvenil, aquele que todo moleque, ao se deparar com um problema, se pergunta: “o que ele faria se estivesse em meu lugar?”. 

Lendo gibis, assistindo TV e vendo filmes percebi que os garotos ocidentais das gerações imediatamente anteriores à minha tinham como seus heróis os cavaleiros do velho oeste. Sempre achei engraçado, inclusive, ver que diversos países (Itália, Brasil, México) produziram um monte de séries, filmes, livros, gibis, etc. com essa temática, mesmo sem ter qualquer relação histórica com go west yankee. Mas é compreensível o fascínio por aquela linguagem, com personagens viris e heróis sempre dispostos a desbravar o desconhecido.


Como nasci em 1980, vivi num tempo em que a massificação do faroeste já era coisa do passado. Mas foi uma época que soube reinventar muito bem a herança deixada pelo imaginário western, um feito levado a cabo pelos japoneses e seus seriados animados ou live-action.

Porém, essa transição aqui no Brasil não aconteceu de forma imediata. Na época a televisão reinava absoluta como maior meio de comunicação e de entretenimento. E até meados dos anos 80, a TV brasileira ainda não havia se rendido aos heróis do outro lado do mundo. Claro que nas décadas de 60 e 70 já havia uma ou outra transmissão de seriados japoneses –  Nacional Kid e Spectroman, por exemplo. Mas só houve de fato um mergulho de cabeça no universo das sagas nipônicas a partir do investimento maciço feito pela extinta TV Manchete, em 1988, quando começou a transmitir as aventuras d'O Fantástico Jaspion.

Depois do Jaspion vieram Changemen, Jiraya, Cavalheiros do Zodíaco, Dragon Ball Z e muitos outros. Embora fossem produções diferentes, todas tinham elementos em comum como o uso de artes marciais e pitadas de ficção científica.

Herdeiras da mitologia dos samurais, todas as sagas japonesas também partiam de uma premissa básica: o valor de um homem é medido pela sua coragem e sua honra. Tal qual nas histórias do universo western.

As semelhanças entre esses dois mundos vão além. Ambos dão espaço ao “herói vagabundo” (vagabundo herói) – os bandoleiros do velho oeste de um lado e os ronins de outro. Estes são usados como símbolos do homem que passa a vida procurando explicações externas para seus conflitos internos.

São dois universos que também compreendem alianças diversas entre os personagens. As alianças podem ser firmadas por heróis diferentes entre si, geralmente com personalidades opostas, ou entre heróis e vilões para combater um mal maior. Tudo sempre pautado por ideais comuns a todas as partes envolvidas.

Óbvio que eu não fui o primeiro a notar essas semelhanças. Já nos anos 70 foi feito um retrato desse diálogo cultural entre oriente e ocidente pelo lendário seriado Kung Fu. Estrelado por David Carradine, o programa contava as aventuras de Gafanhoto, um monge shaolin que resolver ser um andarilho no velho oeste. Em meio a saloons, fazendas, xerifes e ladrões de gado, o personagem aproveita para praticar as suas habilidades nas artes marciais. 

O mesmo Carradine décadas mais tarde interpretou o personagem-título de Kill Bill, um filme que também se propôs a desbravar as estradas poeirentas que ligam o Texas a Okinawa. Intercalando as referências de ambos os lados, a história tem como pontos altos os duelos entre os personagens principais.

Duelos estes que são a razão de ser das histórias envolvendo caubóis ou samurais. É no clima épico da batalha entre dois homens que são resolvidas as suas diferenças. Ou quando simplesmente desejam lutar entre si pra ver no fim das contas quem é o melhor.

Nenhuma imagem me parece mais apropriada para sintetizar todo esse post do que o embate final entre Change Dragon, líder do Esquadrão Relâmpago Changemen, e o Pirata Espacial Buuba. Veja e entenda do que estou falando.